Pictografia |
Este é o quarto texto que escrevo para Klepsidra, a exemplo de seus predecessores, ele também se remete a familiarizar o leitor – seja ele leigo ou iniciado, mas principalmente os leigos – com um panorama geral de uma civilização, desta vez, a escolhida é talvez a mais brilhante civilização da Mesoamérica: a civilização Asteca.
Durante este trabalho, além de explicar as origens, talvez míticas, deste povo, bem como seus precedentes, seu desenvolvimento, apogeu e finalmente sua queda perante os invasores Espanhóis, pretendo mostrar que a idéia sustentada por muitos de que os Astecas constituíam uma Teocracia, tal qual a dos Incas, está no mínimo equivocada e se relaciona com a idéia preconceituosa que nos é incutida ao longo de nossas vidas de que povos indígenas só podem ser atrasados, sendo assim, um grande país indígena não poderia ter outra forma de governo senão uma que justificasse o poder do governante como sendo uma dádiva dos deuses.
Tentarei provar, em minha modesta condição de graduando de História – e apaixonado pela história de povos antigos e medievais, tais como Fenícios, Persas, Gregos, Chineses, Romanos, Árabes, Francos, Vikings, Mongóis e, porque não, Incas, Astecas e Maias – que o verdadeiro sistema de governo dos Astecas era uma espécie de República muito semelhante, inclusive, à República Romana.
Império Asteca |
O México atual não corresponde exatamente ao que foi o Império Asteca (mesmo em se tratando de uma República, como explicarei mais adiante, o termo Império não é errado) em suas dimensões máximas, mas diferentemente do que ocorreu em relação ao Tawantinsuyu (Império Inca) e o atual Peru, o México atual é maior do que o Império Asteca jamais foi.
Para começar, os Astecas jamais dominaram a península de Yucatán, nem tão pouco a península da Califórnia. Além disso, no próprio núcleo do México, na época Asteca, existiam certos "clarões" no Império, ou seja, áreas livres do Império incrustadas em seu coração, como era o caso de Tlaxcala.
A região sofria freqüentes abalos sísmicos e erupções vulcânicas, tendo vulcões de mais de cinco mil metros de altura. Ao norte, à medida que se aproxima do deserto do Arizona, o clima se torna quente e seco, ao sul, já na zona tropical, surgem florestas densas e com fauna e flora ricas.
Além de tudo isso, a região ainda é cortada pelas Sierras Madres oriental e ocidental o que faz com que a altitude média do país esteja entre 3000 e 4000 metros acima do nível do mar. Tamanhas altitudes provocam períodos de frio intenso e estiagem no inverno e final do outono, sendo assim, nada mais natural que as principais cidades pré-colombianas tenham se desenvolvido nas margens de lagos ou arroios.
No que se refere a minérios, o México é muito rico em prata, sendo atualmente um dos maiores produtores mundiais do minério, e chumbo, além de ter (especialmente na época referida) boas reservas de ouro, estanho, cobre e pedras preciosas.
Mapa do México |
Alguns achados arqueológicos têm ajudado muito os pesquisadores a aprenderem mais sobre a história da Mesoamérica, é o caso dos crânios de cristal, de estelas encontradas com inscrições hieroglíficas, calendários e tudo o que resistiu a ação do tempo, dos saques Espanhóis e às fogueiras dos missionários Europeus. Acredita-se que na própria Cidade do México, que foi edificada sobre as ruínas de Tenochtitlán, existam diversos "tesouros" soterrados. Uma simples escavação para a realização de uma obra no centro velho da cidade provou que os achados podem ser abundantes, foram encontradas várias peças totalmente desconhecidas, como o calendário religioso Asteca.
3– A Mesoamérica antes dos Astecas:
Os Astecas, também ditos Mexicas, só chegaram a região conhecida como Mesoamérica no ano de 1325 d.C., porém, antes disso a região já era habitada há muito tempo por povos muito avançados, aos quais os Astecas deveram muito de sua cultura e que talvez, como veremos, tenham sido seus "progenitores".
3.1 – O que é a Mesoamérica:
Achei melhor escrever este item para esclarecer um termo que pode causar dúvidas. A expressão Mesoamérica é empregada com freqüência não com conotação geográfica, mas sim histórica e antropológica, sendo que designa uma região das atuais América Central e do Norte, onde se desenvolveram culturas indígenas avançadíssimas, só igualadas pelas culturas indígenas Andinas, na América do Sul.
A Mesoamérica engloba o México, a Guatemala, Honduras e El Salvador, além de talvez algumas partes de outros países da América Central.
3.2 – O advento Olmeca:
Divindade |
É comum se falar em presença humana na América desde 35000 a.C., no entanto, na Mesoamérica, os primeiros testemunhos de ocupação datam de cerca de 20000 a.C.. Já os fósseis humanos mais antigos encontrados, não são de antes do que 9000 a.C..
É provável que por essa época o homem Mesoamericano estivesse começando a se sedentarizar, processo que só se efetivaria por volta de 5000 a.C., com a descoberta da agricultura (plantio do milho, feijão, abóbora e pimenta malagueta). Porém, para um povo se desenvolver e se tornar uma civilização é preciso um pouco mais do que apenas a agricultura. É preciso pelo menos a existência de uma cerâmica, o que só foi aparecer por volta de 2300 a.C.
Mais ou menos em 1300 a.C., numa região conhecida como Olman (Terra da Borracha), próxima ao golfo do México, ao sul de Veracruz, uma civilização que se tornaria um marco na História pré-colombiana: os Olmecas.
Este povo se disseminou por várias "cidades" (o termo não é muito correto, uma vez que elas eram apenas centros cerimoniais construídos para serem residências de sacerdotes e nobres, além de acolherem os cultos ao deus-jaguar) construindo grandes edifícios em pedras, tais como templos e túmulos, além de trabalhar o barro com maestria. Os Olmecas se tornaram gênios da escultura, criando máscaras, sarcófagos, estelas, as famosas cabeças de basalto da Mesoamérica, além de estatuetas de jade, argila, quartzo, obsidiana, serpentina e cristal de rocha.
Divindade |
Por volta de 600 a.C., a influência Olmeca já era sentida nas proximidades do que viria a ser Tenochtitlán. Porém, à medida que outros povos se desenvolviam, os Olmecas começaram a entrar em decadência e no século II ou III já não mais eram conhecidos, talvez tenham sido destruídos em batalha, talvez tenham migrado para outras regiões, o fato é que desapareceram do contexto da Mesoamérica, mas deixaram seu legado para as civilizações clássicas da região.
3.3 – Maias, o expoente da cultura:
Cerâmica |
Os Maias foram um povo tão impressionante que não me aterei a relata-los muito bem neste item, isso porque numa futura edição de Klepsidra, nesta mesma sessão, haverá um texto exclusivamente sobre eles.
3.4 – Teotihuacán, a metrópole dos deuses:
Templo do sol |
Por volta do início do século V, começou a ser construída a mais impressionante cidade Mesoamericana anterior a Tenochtitlán: a cidade de Teotihuacán.
Localizada nas margens do atual rio San Juan, esta cidade parece ter se expandido muito e formado um verdadeiro Império, sob o qual estavam submetidas vastas áreas, desde o planalto Mexicano, até a zona conhecida como Monte Albán.
O que impressiona em Teotihuacán, no entanto, são três fatores principais: as duas grandes pirâmides (a do Sol e a da Lua, sendo a primeira, uma das maiores, senão a maior, da Mesoamérica), a difusão da fé (culto a Tlaloc, o deus da chuva e da água) e da cultura da cidade por praticamente toda a Mesoamérica e, por fim, o fato de mesmo após seu declínio, por volta do final do século VII, Teotihuacán continuou a ser um importante centro de peregrinações, sendo que até mesmo os governantes Astecas realizavam peregrinações anuais a tal cidade.
Teotihuacán foi, de fato, uma das civilizações clássicas do México pré-colombiano, porém, não sabemos tanto sobre ela devido ao fato de ter se esgotado (pelo menos como Império) cerca de oitocentos anos antes da chegada dos Espanhóis. Contudo, é muito possível que a desintegração do Império tenha ocorrido devido a uma revolta acontecida na própria cidade (que chegou, no seu apogeu a ter cerca de 150 mil habitantes), pois existem fortes indícios de um grande incêndio, no entanto, as chamas atingiram apenas os palácios e edificações governamentais, o que leva a crer que os habitantes, revoltados, tenham ateado fogo aos prédios daqueles que os oprimiam.
3.5 – Toltecas, o poder militar da Mesoamérica:
Ruínas |
Os primeiros Chichimeca a chegarem no México foram os Toltecas, que fundaram sua cidade em 856. A esta cidade, deram o nome de Tula. Contudo, os Toltecas não conseguiram impor seu domínio sobre o vale do México desde o princípio, uma vez que acabaram submetidos pela elite sacerdotal decadente de Teotihuacán. De certo a cultura Tolteca, extremamente militarizada e com uma religião astral, diferia em muito da cultura de Teotihuacán, já que esta estava centrada nos ritos e cultos de Tlaloc e Quetzalcoatl, o deus do vento, a serpente de plumas.
Na mitologia Tolteca, o período em que estiveram sob o domínio de Teotihuacán ficou conhecido como o longo reinado de Quetzalcoatl, que, devido à cultura oral dos Toltecas, acabou por se converter de divindade em realidade. Quetzalcoatl era tido pelos Toltecas como um homem-deus muito justo, mas que os proibia de realizarem seus sacrifícios.
As levas migratórias Toltecas continuaram mesmo após a fundação de Tula, e muitos desses recém chegados convergiram para a cidade, o que a fez crescer muito e se tornar poderosa. Tão poderosa que, segundo as lendas Toltecas, em 999, Tezcatlipoca, o deus-feiticeiro dos Toltecas (representado pela constelação da Ursa Maior) teria se materializado e guerreado contra Quetzalcoatl. Devido a seus feitiços poderosos e ao apoio de seu povo, Tezcatlipoca venceu Quetzalcoatl, o que na realidade simboliza a vitória de Tula sobre a aristocracia sacerdotal de Teotihuacán (que já não era a mesma do período clássico, não pensem que foi esta derrota que fez a cidade entrar em declínio, pois nesta época ela já não possuía um Império há mais de cem anos).
As lendas Toltecas dizem que ao ser derrotado, Quetzalcoatl teria abandonado a região, com destino a Tlillan Tlapallan (o país vermelho e preto), que se localizaria além do oceano oriental (o oceano Atlântico). Entretanto, o soberano divino havia prometido regressar para retomar o trono que lhe fora usurpado, lenda que se transformou na crença do retorno da divindade, reparem que tal crença jamais desapareceu e posteriormente foi incorporada pelos Astecas, sendo assim, acabou se tornando de suma importância quando da chegada dos Espanhóis, mas falaremos sobre isso bem posteriormente.
Com a vitória de Tula sobre Teotihuacán, iniciou-se um novo período no México, o período conhecido como período Tolteca. Graças à hegemonia de Tezcatlipoca, promovido a principal divindade, os sacrifícios passaram a ser realizados diariamente, mas Quetzalcoatl continuou a ser cultuado (em menor grau do que antes, e agora sob a representação do planeta Vênus).
A partir de Tula, os Toltecas se expandiram e iniciaram a formação de um Império. As características deste, no entanto eram bem diferentes das do anterior Império de Teotihuacán, uma vez que aquele havia sido dominado por uma oligarquia sacerdotal, enquanto neste, talvez devido às tradições militares, começa a existir a figura do Rei.
De um ponto de vista cultural, os Toltecas também revolucionaram as regiões que submeteram, é interessante notar que antes deles, os templos eram lugares de culto reservados aos sacerdotes, porém, depois transformaram-se em grandes construções, nas quais o povo se reunia para assistir aos "shows" de sacrifícios e para prestar homenagem aos deuses celestes.
Observatório |
Apesar da queda de Tula, o povo Tolteca continuou existindo e mesmo governando, pois as cidades Maias da península de Yucatán, outrora dominadas pelo Império, se tornaram novamente autônomas, mas com governantes e elite Toltecas, sendo assim, no Yucatán promoveu-se uma síntese Tolteco-Maia (cujo principal expoente foi a cidade de Chichén-Itzá), a qual durou até a conquista Espanhola.
4 – Arquitetura, Sociedade e Cultura:
Dentre as mais importantes noções que se precisa ter sobre uma civilização, com certeza estão o conhecimento de sua arquitetura, sua organização social e seu legado cultural, sendo assim, dividirei este item em três partes, cada uma das quais dará conta de explicar o menos mal possível como se estruturavam cada uma dessas partes da civilização Asteca.
4.1 – A Arquitetura:
Voltemos a falar dos Astecas, cuja história será contada mais adiante, sua arquitetura era, talvez, sua arte mais brilhante, com pirâmides encimadas por templos como sendo a principal característica. Ou seja, as pirâmides propriamente ditas não representavam em si nada, constituíam apenas uma forma de elevar-se os templos mais importantes até uma área alta, onde ficassem mais perto do céu. De todas as pirâmides, a mais gloriosa era, com certeza, a de Tenochtitlán, que estava encimada pelos templos de Tlaloc (o deus de Teotihuacán, que foi assimilado pelos Astecas) e de Uitzilopochtli (a principal divindade Asteca, também chamado de Colibri Azul, ou seja, beija-flor azul).
A maior parte do que sabemos sobre a arquitetura Asteca remete-se a relatos dos conquistadores Espanhóis, já que Tenochtitlán foi inteiramente destruída em 1521. No entanto, sabe-se que a técnica de construção Asteca era diferente da de Teotihuacán, uma vez que naquela cidade, os templos eram construídos de uma só vez, enquanto que em Tenochtitlán, os Astecas iam ampliando os templos à medida que sua tecnologia permitia, sendo assim a grande pirâmide de Tenochtitlán havia antes sido um pequeno templo que após sucessivas ampliações (cinco no total), cada ampliação ocorria de acordo com uma crença religiosa de que o mundo acabaria a cada 52 anos.
Os palácios Astecas, segundo os relatos de Cortez a Carlos V, eram semelhantes aos palácios de outras culturas Mesoamericanas, ou seja, eram grandes estruturas de pedra, divididas em vários cômodos muito grandes dentre os quais se contavam além de quartos e salas, zoológicos (com animais raros) e inúmeros jardins, com fontes e até lagos.
4.2 – A Cultura:
A cultura de uma civilização compreende, de fato, a maior parte de sua alma, se é que se pode dizer que uma civilização tem uma alma. Mas na verdade, tudo o que é desenvolvido pela civilização pode ser considerado parte de sua cultua, no entanto, aqui restringirei a palavra cultura necessariamente às artes Astecas, pois creio que todo o resto (religião, forma de governo, educação...) será abordado em partes posteriores, ao longo do texto.
4.2.1 – As artes Astecas:
Dança Tradicional |
Dentro de tamanha diversidade, havia, por certo, as artes mais importantes e mais praticadas, bem como as de menor importância. Comecemos, pois, com a escultura, uma arte que sempre esteve intrinsecamente ligada ao artesanato em si. No México (como também era denominada a cidade de Tenochtitlán), havia toda a sorte de esculturas, desde de divindades domésticas (antepassados míticos dos diferentes clãs) até esculturas em paredes, tais como jaguares, águias e outros animais. Os maiores escultores da cidade eram pertencentes a uma classe social específica, na realidade, como veremos depois, esta classe era uma verdadeira casta, devido à estagnação social em que se encontrava, a casta dos Toltecas, ou seja, os artesãos Astecas eram de origem Tolteca e haviam chegado a Tenochtitlán posteriormente à expansão Imperial, sendo assim, não constituíam uma parte normal da população.
Escultura |
A literatura Asteca era marcada por poemas nos quais a mistura de situações eram marcantes, pois neles não havia apenas um clima de alegria, ou de emoção, ou de amor, ou de tristeza, mas na verdade, todos os climas misturados, com situações cômicas se alternando com tragédias e posteriores romances.
A vida de governantes famosos era um dos objetos mais apreciados dos poetas para escreverem suas poesias, dentre estes soberanos, o preferido era Nezaualcoyotl, soberano de Texcoco, que reinou entre 1428 e 1472. Ele é considerado o maior poeta e pensador da civilização Asteca, além de ter se destacado como general, ao ajudar Itzcoatl, governante Asteca, a vencer a cidade inimiga de Azcapotzalco e, assim, formar a Tríplice Aliança.
Códice |
Não se pode deixar de ressaltar que a própria escrita Asteca constitui um espécie de arte, uma vez que era hieroglífica (semelhante à egípcia, onde não havia letra, mas sim símbolos que indicavam determinadas coisas, o que dificultava a formação das palavras). Na realidade, a escrita Asteca estava em evolução quando os Espanhóis chegaram, pois começava a se tornar uma escrita sonora, mas ainda baseada nos hieróglifos, ou seja, algumas palavras que não tinha símbolos próprios eram formadas pela mistura de dois ou mais símbolos cuja pronúncia unificada se assemelhasse à pronúncia da referida palavra, por exemplo, para dizerem o nome da cidade de Quauhtitlán, para a qual não havia um símbolo específico eles misturavam dois glifos em um, ou seja, desenhavam uma árvore (cuja pronúncia é quauitl) com dentes (cuja pronúncia é tlanti), sendo assim, com a junção dos sons se chegava a algo parecido com Quauhtitlán.
Máscara de Dança |
As danças, bem como as interpretações, eram usadas para divertir os mais importantes, segundo Cortez, Motecuhzoma II (que ficou conhecido como Montezuma), tinha vários homens deformados, e outros tantos anões que dançavam e faziam coreografias bizarras para ele todos os dias durante suas refeições.
Os dançarinos profissionais tinham o intuito de divertir os poderosos, mas o povo, em suas festas, também dançava e sempre ao som de músicas, que eram escritas por poetas, ou apenas executadas com instrumentos próprios, como diversos tipos de tambores (alguns feitos de madeira e couro, outros de casco de tartaruga), gongos, chocalhos, guisos, reco-reco (bastões de osso que eram raspados com um arco de madeira), flautas, flautas de pan, trombetas e conchas que seriam como uma espécie de castanholas.
No que se refere à cultura Asteca, a principal cidade era Texcoco, onde em tudo havia mais perfeição, desde a língua falada (o Nahuatl era mais bem pronunciado, assim como a diferença entre o Inglês da Inglaterra e o dos EUA) até a poesia e a música em si, isso se deve em muito ao próprio Nezaualcoyotl, que acabou por transformar Texcoco no centro cultural e jurídico mais importante do Império.
4.2.2 – Os esportes:
Os Astecas, assim como os Romanos, também tinham uma espécie de Circo em Tenochtitlán, nesta arena era praticado o mais popular esporte Mexicano, inventado pelos Maias, ele foi praticado por diversos povos, inclusive pelos Astecas, que construíram sua arena em plena praça cerimonial de sua capital.
Mas afinal, que esporte era esse? Era um esporte cujo nome era tlachtli, mas que é conhecido hoje como: A Bola Maia.
Consistia de um jogo onde dois times se confrontavam num campo em forma de "T". A forma do campo imitava aquilo que os Astecas acreditavam ser a forma do céu. No campo, os adversários disputavam a posse de uma bola de borracha maciça (tão dura que chegava a quebrar ossos de alguns jogadores e a matar se batesse na cabeça), que não podia ser segurada, apenas tocada de um para o outro, com a ajuda dos joelhos, cotovelos e quadris. Os jogadores utilizavam protetores de couro e madeira nessas regiões.
O objetivo do jogo era passar a bola por uma argola de pedra na parede protegida pelo time adversário, quando uma "cesta" era feita, o jogo acabava e o autor do ponto tinha direito de ficar com todas as jóias dos espectadores, estes por sua vez, sempre fugiam ou iam assistir a partida com poucos pertences, para não ficarem sem suas coisas. Com efeito, o tlachtli era uma maneira de se enriquecer em Tenochtitlán. O tlachtli inspirou a criação, no século XX, do vôlei e do basquete, por não ser permitido prender a bola, apenas toca-la e pelo objetivo ser fazer uma cesta.
Além do tlachtli, que era o esporte preferido dos Astecas, mas praticado principalmente pela nobreza (membros do Grande Conselho), havia outros tipos de esporte, como o patolli, que era um jogo de tabuleiro (semelhante a loto), muito praticado pelas camadas populares, no qual o objetivo era colocar três peças em seqüência. Havia competições como subir no "pau-de-sebo", e outra que hoje fazem parte de gincanas populares, porém, em todas essas disputas, havia largas apostas, sendo que existia em Tenochtitlán uma verdadeira bolsa de apostas, que enriqueceu muitos, mas condenou muitos outros à escravidão por dívidas.
Apesar de não ser considerado propriamente um esporte, havia um tipo de sacrifício que atraia platéias que, além de cultuarem o deus para o qual o sacrifício estava sendo feito, também torcia (para isto era proibido fazer apostas). Consistia numa espécie de luta de gladiadores, onde o indivíduo que iria ser sacrificado tinha o pé amarrado a uma pesada argola de pedra e, armado com armas de brinquedo, era obrigado a enfrentar quatro guerreiros (dois guerreiros-águia e dois guerreiros-jaguar) fortemente armados. Quando morresse, era considerado sacrificado para os deuses.
A perda de dinheiro e bens em apostas nos esportes condenou muitos Astecas à embriaguez e ao vício no tabaco, grandes causas de morte em Tenochtitlán.
4.3 – A sociedade Asteca:
A sociedade Asteca estava dividida de uma maneira curiosa e um pouco diferente da das sociedades européias que lhe foram contemporâneas. Se desenhássemos uma pirâmide dela, teríamos sete divisões: no topo estariam os governantes, compostos pelo Tlatocan, pelos três maiores sacerdotes e pelos dois governantes; depois viriam os grandes dignatários e os altos sacerdotes; abaixo estariam as elites dos Calpulli (bairros, formados por membros do mesmo clã); abaixo destes estariam, num mesmo patamar, as duas castas (imóveis) da sociedade Asteca: os Pochtecas (comerciantes) e os Toltecas (artesãos); abaixo destes estavam os moradores livres e proprietários de terras dos Calpulli, ou seja, o povo; abaixo do povo, havia um número cada vez maior de servos, ou seja, cidadãos que haviam perdido suas terras por dívidas, tendo se convertido em servos de outros, mas ainda assim livres, os servos trabalhavam por dinheiro, se assemelhando a trabalhadores assalariados; abaixo dos servos estava o estamento (por ter pouca mobilidade social) dos escravos, estes, apesar de serem utilizados como força de trabalho, não tinham nesta a sua principal função, pois eram destinados ao sacrifício, havia duas maneiras de alguém se converter em escravo: a primeira era também a mais comum, ou seja, os vencidos nas guerras, mas a segunda, apesar de pouco usual, também existia, e eram as dívidas, ou seja, quando alguém que já havia perdido suas terras e se convertido num servo se endividava, tinha que vender a própria liberdade para pagar a dívida, se convertendo num escravo.
Quando cito classes, castas e estamentos, pressuponho que o leitor esteja compreendendo o que digo, mas para aquele que não estiverem familiarizados com os termos, aqui vão suas definições: uma sociedade de classes é como a sociedade brasileira, ou seja, onde todos os cidadãos, independentemente de condição social, classe, ou qualquer outra coisa, são iguais perante a lei, sendo assim, é totalmente possível a ascensão (ou o declínio) social, dependendo unicamente das oportunidades e do esforço do indivíduo para que isso aconteça; já numa sociedade de estamentos, os homens não são iguais perante a lei, apenas perante os deuses, sendo, portanto passíveis de salvação, no entanto sua condição (geralmente determinada pelo nascimento, o que não é o caso no único estamento Asteca) só pode ser mudada (ou seja, ocorrer elevação ou declínio social) devido a um fato muito inusitado, como o casamento com alguém de outra casta, ou um ato de extrema bravura, um exemplo de sociedade de estamentos (ou estamental) era a sociedade da Europa Medieval; numa sociedade de castas, as pessoas são diferentes em tudo, tanto perante a lei, quanto perante os deuses, sendo assim, não há nenhuma mobilidade social, o nascimento determina a posição do indivíduo na sociedade e não há nada que possa mudar isso, nem para melhor, nem para pior, um exemplo de sociedade de castas é a Índia.
Agora que compreendemos os conceitos utilizados, podemos continuar com a análise da sociedade Asteca. Tratava-se de uma sociedade de classes, pois exceto pelas duas castas e pelo único estamento, a mobilidade social só dependia do esforço de cada um. Mas espere, você deve estar se perguntando, todos nós sabemos que para ascender socialmente, a única maneira é estudando, freqüentando a escola e assim, tendo a possibilidade de crescer na vida, certo? Certo. Então, como os Astecas faziam para ascenderem socialmente?
Da mesma maneira que nós. Deixe-me explicar. Em cada Calpulli, e existiam quatro, havia uma escola denominada Telpochcalli, para ela, as crianças (tanto homens quanto mulheres) iam ao completarem oito anos. Lá, tanto meninos quanto meninas aprendiam o básico da escrita Asteca e as tradições de seus clãs, porém, a outra metade do ensino era dividida, pois as meninas aprendiam a tecer, a costurar, a cozinhar e a cuidar de crianças, enquanto os meninos aprendiam a guerrear.
Aos 21 anos, tanto meninos quanto meninas abandonavam a escola e estavam formados, os meninos tornavam-se guerreiros (sendo assim, todos os homens livres de Tenochtitlán eram guerreiros), e as meninas iam se casar. Geralmente o homem se casava mais tarde, por volta dos 25 anos. A poligamia masculina era permitida, mas não muito difundida, ao que parece apenas alguns poucos homens muito ricos tinham mais que uma esposa.
Mas analisemos as possibilidades de ascensão: todos os homens tinham direito, ao nascerem, a um lote de terra, que lhes era entregue pelo chefe do clã, quando estes casavam. Neste lote, o homem ia trabalhar junto com sua mulher e seus filhos até que estes se casassem. Nos tempos em que o marido ia para guerras, a mulher ficava tomando conta da terra e da casa. À medida que ascendia na carreira militar (que era levada paralelamente à sua vida de lavrador) o homem podia receber mais terras, e sendo assim, ascender socialmente, chegando mesmo a ter escravos trabalhando para ele adquirindo destaque na vida pública da cidade, o que poderia conferir a qualquer homem (por seus méritos militares) um assento no Grande Conselho, uma espécie de Senado Asteca. Quando um homem vendia parte de sua produção, ele adquiria dinheiro (que era representado por sementes de cacau) com dinheiro ele podia comprar coisas no mercado, coisas que iam desde sementes até escravos, passando por obras de arte e bens de consumo. Outra maneira de adquirir dinheiro era vendendo prisioneiros para os Toltecas e Pochtecas, pois uma vez que estes não participavam do exército, precisavam comprar prisioneiros para sacrificar aos seus deuses. Com o dinheiro, era possível comprar coisas melhores, mais coisas, ou então financiar alguém cuja plantação tenha sido perdida; este alguém tornava-se um devedor e, caso não pagasse a dívida, perdia sua terra e se tornava um servo de seu credor.
4.3.1 – Os níveis sociais:
Nesta parte do texto, atribuirei números às diferentes camadas da sociedade (ver organograma) e explicarei o papel de cada um deles na sociedade Asteca.
1) Tlatoani: O Tlatoani era o chefe supremo tanto militar, quanto religioso. Este cargo foi desempenhado por onze indivíduos desde a construção de Tenochtitlán, no início, ele tinha características semi-reais, mas aos poucos passou, cada vez mais, a ser uma espécie de Cônsul. Quando os Espanhóis chegaram ao México, quem ocupava esta função era justamente Motecuhzoma II, e Cortez, mais do que depressa o confundiu com um Imperador. Na verdade, os relatos dos chefes das cidades dominadas pelos Astecas, de que eram vassalos de Motecuhzoma II não eram mentirosos, pois era o Tlatoani quem governava as províncias conquistadas, no entanto, seu poder não era grande dentro de Tenochtitlán. É certo que a pompa com a qual era tratado era digna de um Imperador, mas isso fazia parte da tradição, pois enquanto o outro Cônsul trabalhava, este ficava sendo cultuado. Parte da pompa com a qual eram tratados os Tlatoani, contribuiu ainda mais para a imagem de divindade que Cortez criou sobre o cargo, pois as roupas que usava eram destruídas (ou seja, cada roupa, apesar de suntuosa, só era usada uma única vez), ele era carregado em liteiras e não podia ser encarado por pessoas do povo, os únicos que podiam olha-lo nos olhos eram o Ciuacoatl, os membros do Tlatocan e os membros do Grande Conselho.
2) Ciuacoatl: A tradução desta palavra quer dizer Serpente Fêmea, entretanto, o cargo só era ocupado por homens. Era o outro Cônsul que governava junto com o Tlatoani. Seus poderes eram diferentes, mas tão importantes quanto os do primeiro. Na verdade, o Ciuacoatl era quem governava Tenochtitlán, além de ser o equivalente à suprema corte de apelações, pois quando as demais instâncias eram refutadas, era este Magistrado quem decidia a sentença.
O cargo de Ciuacoatl foi criado por Motecuhzoma I, com o objetivo de se desvencilhar de algumas funções, visto que em sua época, o Império havia começado a se expandir e conseqüentemente o Tlatoani havia ficado sobrecarregado.
Quando o Tlatoani morria, o Ciuacoatl presidia reunia e presidia o Grande Conselho, para escolher entre os membro do Tlatocan um novo Tlatoani. Por sua vez, quando o Ciuacoatl morria, o Tlatoani escolhia um novo, sendo, no entanto, esta escolha sujeita a aprovação do Tlatocan e do Grande Conselho.
Assim como o cargo de Tlatoani, o Ciuacoatl era vitalício, mas estava sujeito , assim como o primeiro, a sofrer um "IMPEACHMENT" no caso de má conduta governamental.
A existência desse dois Magistrados reforça a teoria de que os Astecas não constituíam uma Teocracia, mas sim uma República, pois como veremos, qualquer um poderia ascender aos cargo de Tlatoani e Ciuacoatl, graças as suas proezas militares. Na verdade, o que leva alguns historiadores a também considerarem o Império Asteca como uma Teocracia era o fato de que tanto no que se refere ao Ciuacoatl, quanto no que se refere ao Tlatoani, os cargos foram, desde o princípio ocupados por membros de uma mesma família, sendo muitas vezes o Ciuacoatl, irmão do Tlatoani. No entanto, isso era apenas uma questão de influência desta família (tanto por sua antigüidade, quanto por seu poder) no caso do Tlatoani, e de nepotismo, no caso do Ciuacoatl.
Podemos caracterizar a sociedade Mexicana como sendo uma Oligarquia Plutocrática, com a funcionalidade real de uma Oligarquia Aristocrática, ou seja, por direito qualquer um que tivesse status suficiente (status adquirido nas batalhas ou religiosamente, como veremos) poderia governar, mas na prática, apenas uma aristocracia (a mesma família sempre) dominou o poder.
3) Tlatocan: Era uma espécie de junta governativa formada por apenas quatro membros, geralmente todos parentes do Tlatoani e do Ciuacoatl, o que mostra mais uma vez o domínio daquela família, mas não sua condição de intocável no poder, uma vez que houve membros do Tlatocan que não eram parentes dos governantes e chegaram a essa posição através da influência pessoal.
Esse posto pode ter sido o indicador de uma espécie de fase de transição entre o Grande Conselho e o poder, pois os membros do Tlatocan eram eleitos pelo Grande Conselho e depois, com a morte ou do Ciuacoatl, ou do Tlatoani, um dos quatro era escolhido para ocupar o posto e os outros três voltavam a ser apenas membros do Grande Conselho, uma vez que eram eleitos outros quatro membros para o Tlatocan. Quando um dos membros morria, o Grande Conselho se juntava e elegia outro.
A função principal desses quatro homens era chefiar os exércitos, eram os quatro generalíssimos Astecas, cabendo a um deles a chefia dos Guerreiros, a outro a confecção e correta distribuição de armas e mantimentos aos exércitos, ao outro a manutenção de guarnições nas colônias e ao último, a segurança de Tenochtitlán.
4) Grande Conselho: Era o órgão fundamental da estrutura de poder Asteca, na realidade, a existência desse cargo indica que todo poder emanava do povo, não diretamente, como numa Democracia, mas de uma forma indireta. O Grande Conselho era composto por diversos indivíduos, todos de muita importância na cidade, eram eles: os quatro Calpulli (chefes de Calpulli), todos os Guerreiros-Águia e Guerreiros-Jaguar, os Grandes Sacerdotes (é provável que mulheres tenham ocupado funções de Grandes Sacerdotisas, sendo assim, haveria mulheres no Grande Conselho), o Mexicatl Teohuatzin e as duas Serpentes de Plumas.
O número de membros do Grande Conselho não pode ser precisado, pois não havia uma quantidade fixa de Guerreiros-Águia, nem de Guerreiros-Jaguar, nem de Grandes Sacerdotes. As três categorias constituíam o ápice daquilo que se pode alcançar por esforço próprio, ou seja, sem ser votado por ninguém, mas apenas por si. Os Guerreiros-Águia e Guerreiros-Jaguar constituíam o topo da carreira militar (algo como uma tropa de elite) e os Grandes Sacerdotes constituíam a elite intelectual, formada no Calmecac, que explicarei posteriormente o que era.
O Grande Conselho podia passar meses sem se reunir, mas todas as vezes que algum de seus membros, ou algum dos Magistrados superiores achasse por bem, uma reunião era convocada. As decisões do Grande Conselho eram a instância máxima de deliberação nos assuntos econômicos, políticos e militares, só não respondiam por poder judiciário. Era, por exemplo, o Grande Conselho que definia quando, e onde aconteceriam campanhas militares, ou mesmo quanto cada região deveria pagar em tributo.
5) Dignatários: Eram os homens importantes por nascimento, não por esforço, constituíam-se geralmente de filhos de Calpulli que não haviam conseguido se formar no Calmecac, ou que haviam se formado, mas ainda eram Sacerdotes de Bairro. Os dignatários eram acessores do Grande Conselho e dos grandes Magistrados, eles eram os responsáveis pela manutenção das listas de tributos em dia, pelo recenseamento da população, pela confecção dos mapas do Império e de regiões que não pertenciam a ele, dentre outras tarefas que exigiam certo grau de instrução ou de confiança.
6) Uey Calpixqui: Era um Magistrado importante, não fazia parte do Grande Conselho, mas constituía-se no braço direito do Ciuacoatl, pois era o encarregado de perambular pelos Calpulli recolhendo impostos, repassando informações, verificando coisas erradas. Seu poder maior consistia no fato de ter poder judiciário, ou seja, ele era uma espécie de segunda corte de apelações, a segunda instância jurídica, caso a primeira instância, não fosse justa ou não conseguisse apurar o caso, ele resolveria, senão, repassaria ao Ciuacoatl. É interessante notar que havia apenas um Uey Calpixqui em Tenochtitlán, e ele era escolhido diretamente pelo Ciuacoatl. Havia um Uey Calpixqui em cada colônia militar fundada pelos Astecas, ele era o prefeito desta colônia, e estava encarregado de garantir a lealdade da região além de julgar os casos como instância superior às autoridades locais. Além disso, ele era o comandante das tropas da colônia e, apesar de não ter autorização para iniciar campanhas de conquista, tinha o dever de defender a região dominada (tanto contra inimigos externos, quanto contra uma possível revolta da população da própria região).
7) Calpulli: Ironicamente o Calpulli faz parte do Grande Conselho, mas enquanto Calpulli ele é subalterno do Uey Calpixqui, que não integra o Grande Conselho. O Calpulli é o líder de seu Calpulli (é interessante notar que a palavra é a mesma tanto para bairro, quanto para o governante do bairro). Vive numa casa muito grande, e é o responsável pelo ensino nos Telpochcalli. Ele constitui o tribunal de primeira instância, onde se resolvem quase todos os casos. Existiam quatro Calpulli em Tenochtitlán, cada um formado por uma junção de clãs. Talvez a divisão em quatro seja proveniente de memória passadas, de quando os Astecas viviam em Aztlán, e estavam divididos em quatro clãs.
Era o Calpulli quem organizava as propriedades de seu bairro, ele tinha a lista de todos os que se casavam e recebia terras, além de comandar as divisões de serviço nas milícias do bairro, uma vez que a administração militar era descentralizada, com os generais mandando em seus subordinados e estes em seus subordinados respectivamente, até chegarem nos novos recrutas, que não mandavam em ninguém.
8) Conselho de Anciãos: Eram os conselhos dos Calpulli, ou seja, dos bairros, funcionavam exatamente da mesma forma que o Grande Conselho, mas com autoridade restrita ao seu bairro. Era composto pelo líder de cada clã componente do Calpulli, e tinha por finalidade principal fiscalizar a administração do Calpulli e ainda escolher o novo Calpulli quando o antigo morria, os filhos dos Conselheiros tinham o direito de freqüentar o Calmecac, se quisessem.
9) Maceualtin: Eram as famílias de pessoas do povo, parentes dos Conselheiros, mas não de seu tronco familiar, uma vez que um clã é composto de diversas famílias aparentadas. Na verdade, os Maceualtin eram os núcleos familiares domésticos, ou seja, as pessoas que viviam sob o mesmo teto. Os homens recebiam do Calpulli um lote de terra onde iriam erguer sua casa e viver sua vida, quando ambos os cônjuges morriam, o lote voltava para o Calpulli, que o daria a um novo casal, dessa forma, não faltavam terras para as pessoas, pois ninguém herdava nada. É certo que as terras que fossem compradas de Maceualtin endividados não entrariam na redistribuição de terras, sendo assim, uma família poderia aumentar seu poder e importância, adquirindo terras de pessoas endividadas, pois assim teriam direito a heranças, além do lote, e seu poder permaneceria inabalável.
10) Tlalmaitl: Eram os Maceualtin que perdiam suas terras por dívidas, convertendo-se em servos. Os Tlalmaitl continuavam vivendo na terra que era deles, mas não mais poderiam usufruir o que produzissem, deveriam entregar uma determinada cota mensal a seu senhor, caso esta cota não fosse alcançada, o servo adquiria uma dívida com o senhor, quando a dívida chegava a um ponto determinado, ele era obrigado a vender sua liberdade e se tornar um escravo de seu servo. Porém, a condição de servo não era hereditária, ou seja, os filhos do servos podiam freqüentar a escola normalmente e, quando se casavam, recebiam um lote de terra, sendo assim, a servidão só condenava o indivíduo e sua esposa. O Tlalmaitl tinha sempre a oportunidade de readquirir sua terra, bastando para isso economizar, ou então trabalhar mais, para poder obter produção excedente e vende-la, ou então, capturar vários escravos em batalhas e, então, vendê-los a comerciantes ou artesãos, o que lhe garantiria dinheiro para poder comprar terras.
11) Tlatlacotin: Constituíam os escravos, a maioria dos quais era derrotada em combate e escravizada. Os escravos derrotados em combates eram, geralmente inúteis para o trabalho, pois para traze-los vivos, os guerreiros eram obrigados a mutila-los, cortando-lhes os tendões de Aquiles, sendo assim, não conseguiam correr e andavam com dificuldade. Estes escravos eram mantidos vivos por um certo tempo, até que chegasse a hora de serem sacrificados.
Já os escravos por dívidas eram às vezes aproveitados no trabalho, havia casos de grandes propriedades as quais viviam da mão-de-obra escravista, por já não terem mais servos há muito tempo, uma vez que a propriedade ficava em mãos do comprador, mas a condição de servo era apenas para o indivíduo que havia se tornado servo, então, para que as terras pudessem ser cultivadas, estes senhores mantinham escravos chegando a compra-los no mercado, ou de guerreiros que voltavam de batalhas.
Além desses dois tipos mais comuns de escravidão, também existia a condenação à escravidão, ou seja, dependendo do crime que alguém cometesse, este poderia ser castigado e condenado a ser um escravo.
A única maneira de um escravo deixar esta condição era quando ele iria ser vendido no mercado de Tlatelolco. Quando alguém o comprava, o vendedor o soltava, então ele tinha o direito de correr, sendo perseguido por seu comprador. Ninguém poderia segura-lo, senão seu comprador, se ele conseguisse alcançar a praça judicial de Tlatelolco, estaria livre, no entanto, se fosse pego por seu comprador, seria escravo para sempre. No entanto, pouquíssimos escravos escapavam dessa forma, pois como mencionei, seus tendões eram geralmente cortados, sendo assim, a corrida se tornava quase impossível e eles acabavam pegos.
12) Pochteca: Os Pochteca constituíam uma casta privilegiada da população Asteca. Ninguém podia ascender a Pochteca, nem mesmo o mais ilustre dignatário, no entanto, um Pochteca também nunca deixaria de ser um Pochteca. Eram os grandes comerciantes, uma vez que o pequeno comércio (bens de consumo e outras coisas de pouco valor) estava nas mãos dos Maceualtin, aos Pochteca cabia o grande comércio, o comércio interprovincial e a revenda de grandes quantidades de mercadorias.
Os filhos deles podiam freqüentar o Calmecac, mas nunca ascenderiam a Grandes Sacerdotes, pois sua casta não tinha assento no Grande Conselho.
Os Pochteca tinham cultos próprios, independentes dos cultos Astecas, seu deus principal era Yiacatecuhtli, o protetor dos comerciantes, que lhes exigia pesados sacrifícios, sendo assim, como não estavam obrigados ao serviço militar, eram obrigados a comprar escravos dos guerreiros, sendo os maiores compradores de escravos do México. Sua base principal era o mercado de Tlatelolco, que como veremos, havia sido uma cidade independente, mas fora anexada ao território propriamente dito de Tenochtitlán, por Axayacatl, em 1469; outras bases importantes dos Pochtecas eram Texcoco, onde podiam participar do Conselho Econômico e Azcapotzalco. Por possuírem uma milícia própria, encarregada de defende-los em suas caravanas, os Pochteca às vezes prestavam serviços de espionagem ao governo. Por terem vencido uma grande batalha no istmo de Tehuantepec, foram considerados por Auitzotl, como os tios do Tlatoani, o que lhes conferiu (a partir daquela data) um status superior, que permitia a utilização de jóias de ouro, coisa que era vetada aos não membros da aristocracia.
Quando os Espanhóis chegaram ao México, os Pochteca se encontravam num patamar intermediário entre o povo e os grandes dignatários, mas seu poder econômico lhes proporcionava um luxo superior em muitos casos ao dos próprios governantes. Pode-se dizer que, esta classe estava começando a se tornar importante, o que poderia acarretar, dentre de cem ou duzentos anos, uma espécie de transformação na sociedade Asteca, passando a um modo de produção semelhante ao Capitalista, quando se encontrava num modo de produção familiar-militar, pouco voltado para a obtenção de lucros e com muita cooperação entre os indivíduos, tanto que os Calpulli entregavam aos Maceualtin, uma vez por ano, uma grande quantidade de roupas e mantimentos, de modo a garantir a melhoria da qualidade de vida da população.
13) Toltecas: Os Toltecas eram os artesãos de Tenochtitlán, viviam em um bairro próprio, Amantlan, e se consideravam originários da cidade de Xochimilco, nas margens do lago Texcoco. Trabalhavam tanto para particulares, por meio de contrato, como para venderem seus trabalhos. Os mais hábeis eram muito bem remunerados, e trabalhavam com exclusividade para altos dignatários. As famílias Toltecas se reuniam em clãs, que eram verdadeiras corporações de ofício, onde o chefe do clã comandava sua produção e o representava judicialmente. Estavam obrigados a pagar impostos em espécie, ou seja, naquilo que produzissem, mas não em dinheiro, como todos os demais. Não eram obrigados ao serviço militar e seus filhos não podiam freqüentar o Calmecac, bem como não tinham representação no Grande Conselho.
Tal qual os Pochteca, os Toltecas também tinham um deus próprio e independente, Xipe Totec, que, à exemplo de tantos outros, também exigia sacrifícios, o que forçava a casta a ser grande compradora de escravos. Ainda como no caso dos Pochteca, não se podia ascender a Tolteca, nem sequer um Tolteca podia deixar de sê-lo.
14) Tlacateccatl: Este era um Magistrado, na verdade, era um dos quatro componentes do Tlatocan, mas sua figura merece especial atenção, pois ele era o chefe de homens, ou seja, o general dos exércitos nas batalhas. Cabia ao Tlacateccatl, além de chefiar as tropas e decidir as estratégias militares, fiscalizar o cumprimento correto da hierarquia militar (que é o que retratarei nas descrições seguintes), da qual, abaixo do Tlatoani, ele era o expoente máximo.
15) Guerreiros-Águia: Constituíam um dos pelotões de elite do exército Asteca. Vestiam-se com uma leve armadura de couro, recoberta de plumas de águias, além disso, levavam nas cabeças, um capacete de madeira em formato de cabeça de águia (também revestido de penas). Normalmente lutavam com lanças compridas, as quais não arremessavam, mas apenas utilizavam para ferir seus oponentes.
Para chegarem a esse cargo, os homens trilhavam um caminho longo, deveriam completar seus estudos nos Telpochcalli, e depois capturar vários prisioneiros em batalha, uma vez que a ascensão militar se dava pela captura de prisioneiros vivos. Ao atingir o posto de Guerreiro-Águia, um homem ganhava assento no Grande Conselho e passava a fazer parte da vida política do Império.
16) Guerreiros-Jaguar: Estavam no mesmo patamar de importância dos Guerreiros-Águia, assim como eles, eram ungidos pelo próprio Tlatoani (o chefe supremo dos exércitos) e passavam a constituir a verdadeira nobreza (sempre junto com seus correlatos Guerreiros-Águia, uma vez que esta descrição é um complemento da outra), recebendo mais terras e passando a se dedicar quase que exclusivamente à vida política e militar, deixando seus afazeres domésticos nas mãos de escravos.
Os poucos casos de poligamia se davam geralmente com homens dessas duas patentes militares (Águia e Jaguar), pois, em suas campanhas, às vezes se envolviam com outras mulheres e terminavam por adota-las como suas segundas, ou até terceiras esposas.
Ao que parece, havia um templo, em Malinalco (templo que persiste até hoje), totalmente escavado na rocha, no qual os Guerreiros-Águia e os Guerreiros-Jaguar praticavam seus principais cultos.
Os Guerreiros-Jaguar, normalmente não portavam lanças, mas sim a principal arma Asteca, uma maça de madeira entalhada, com facas de sílex incrustadas na região de golpe (chamada macana), sendo assim, essa arma era mortal, por ser altamente cortante. Além disso, esses Guerreiros se trajavam com o couro de jaguares mortos, e utilizavam um capacete confeccionado com os ossos da cabeça do animal, tendo neles as presas e o pelo ainda intactos. Como sua armadura proporcionava menos resistência do que a dos Guerreiros-Águias e sua arma era de uma mão apenas, então, utilizavam um escudo de madeira revestido de plumas e delicadamente pintado com ouro.
17) Hierarquia Militar dos Bairros: Em cada Calpulli existia um Telpochcalli, no qual se formavam turmas de novos guerreiros. Estes novos Guerreiros tinham uma função horrível: serem os homens do pelotão de frente. Utilizavam armas muito simples, como fundas e clavas, mas estavam determinados a capturarem três prisioneiros, o que lhes garantiria a ascensão à próxima patente. À medida que iam sendo promovidos, iam adquirindo o direito de utilizarem armas melhores, além de ganharem armaduras em determinada patente. As armas diversas eram: machadinhas de sílex, arco e flecha, facas de sílex, espadas de sílex e até lanças curtas que eram arremessadas por um equipamento chamado atlatl.
A cada três prisioneiros que o indivíduo capturava, ele era promovido uma patente. A patente máxima de cada Calpulli era denominada Mestre de Armas. Quando alguém chegasse a ser Mestre de Armas, estava a um passo de se tornar um Guerreiro-Águia, ou um Guerreiro-Jaguar, bastando apenas capturar mais três prisioneiros.
18) Cadetes dos Telpochcalli: Os Cadetes dos Telpochcalli eram os garotos que estavam para se formar na escola, eles iam a algumas campanhas junto com os guerreiros, mas não para lutar e sim para aprenderem com o que viam. Nessas campanhas eles cozinhavam e guardavam a comida do exército.
19) Serpente de Plumas de Tlaloc: Era um dos dois maiores sacerdotes Astecas, junto com ele estava a Serpente de Plumas de Uitzilopochtli. Era um sacerdote que havia percorrido um longo caminho, ou seja, quando criança, estudou no Telpochcalli de seu Calpulli, quando formado, por ser filho de algum Conselheiro ou do próprio Calpulli, tinha a opção de freqüentar o Calmecac (o Calmecac era a universidade Asteca, localizado no centro cerimonial de Tenochtitlán, tinha a função de formar os sacerdotes, que viriam a ser os especialistas da escrita e também a elite cultural Asteca, além de propagadores da religião de seus ancestrais). Depois de quase dez anos no Calmecac, ele se formava e se tornava um sacerdote de Calpulli, voltando ao seu Calpulli, com o objetivo de realizar as cerimônias religiosas devidas. Muitos sacerdotes, como veremos, passavam suas vidas inteiras sem conseguir serem promovidos, no entanto, ao se destacarem na vida pública, geralmente servindo como escribas ou então realizando algum ato importante, o sacerdote era elevado a um nível superior. Passava a ser um Sacerdote Provincial, que veremos mais tarde, quando se destacava como missionário, era elevado a Grande Sacerdote e ganhava um assento no Grande Conselho.
Dentre os Grandes Sacerdotes, o Tlatoani, juntamente com o Ciuacoatl e o Tlatocan, escolhiam um para ser a Serpente de Plumas de Tlaloc e outro par ser a Serpente de Plumas de Uitzilopochtli, se a escolha passasse pela aprovação do Grande Conselho, o Sacerdote estava eleito para o cargo.
O cargo de Serpente de Plumas de Tlaloc não podia ser ocupado por mulheres, e estava imbuído de poderes extremos no que diz respeito ao culto do deus da chuva e da água.
20) Serpente de Plumas de Uitzilopochtli: Assim como no caso da descrição dos Guerreiros-Jaguar, esta descrição é uma continuação da descrição do item anterior. Um sacerdote chegava a ser Serpente de Plumas de Uitzilopochtli da mesma forma descrita no item anterior, porém sua função era de controlar o culto a Uitzilopochtli, a mais antiga e poderosa divindade Asteca, só igualada a Tlaloc, muito tempo depois da chegada dos Astecas ao México.
Era indiscutível o poder que esses dois sacerdotes possuíam juntos e, na maioria das vezes, permaneciam juntos. Acima deles, na hierarquia clerical só estava o Tlatoani, que era o supremo chefe religioso, no entanto, eram os dois que comandavam o clero de fato. Tamanho era seu poder, que durante o governo de Auitzotl, convenceram a quem deviam de que a ampliação do Grande Templo fosse realizada no sentido de dedica-lo a Tlaloc e Uitzilopochtli, sendo assim a pirâmide Asteca passou a ser encimada pelos templos de Tlaloc e Uitzilopochtli.
Apesar de imensamente poderosos, os dois sacerdotes não tinham nenhum poder direto sobre o clero de um modo geral, pois este poder emanava do chefe do Calmecac, o Mexicatl Teohuatzin. No entanto, este era escolhido por aqueles.
21) Mexicatl Teohuatzin: O Mexicatl Teohuatzin era o chefe do clero Asteca, além de controlar o Calmecac. Chegava a esse posto pela escolha em comum acordo das duas Serpentes de Plumas. Eles o escolhiam entre os Grandes Sacerdotes homens e, sendo assim, acabavam controlando-o. É bem verdade que as Serpentes de Plumas estavam acima da autoridade do Mexicatl Teohuatzin, mas este não estava legalmente subordinado a elas, só ao Tlatoani.
22) Grandes Sacerdotes: Este é o grau máximo em que alguém poderia chegar por esforço próprio, dentro da carreira clerical, mas mesmo assim, não era uma ascensão tão simples quanto a possível na carreira militar, pois para mostrarem seu valor, os sacerdotes inferiores precisavam chamar a atenção de alguém importante, pois só assim seriam promovidos, em contrapartida, se já conhecessem ou fossem aparentados de alguém importante, suas promoções não tardariam em chegar, por isso pode-se dizer que o clero era a instituição mais corrompida do Império Asteca.
Os Grandes Sacerdotes eram os primeiros sacerdotes a terem assento no Grande Conselho, sendo também a única forma de uma mulher conseguir seu assento na entidade, uma vez que este era (entre todos os postos existentes no México) o mais alto posto que uma mulher podia ocupar.
A função destes sacerdotes era lecionar no Calmecac (o que leva a crer que possivelmente existisse um número máximo para eles, e não um número ilimitado como ocorria com os Guerreiros-Águia e Jaguar). Eles também, ao serem sagrados Grandes Sacerdotes, recebiam o status de nobreza, recebendo terras extras, das quais cuidavam com a mão-de-obra escrava.
23) Sacerdotes Provinciais: Este era o segundo degrau da hierarquia sacerdotal, e todos os sacerdotes que quisessem ascender no clero, deveriam passar por ele. É certo que também era o mais árduo e o mais fácil de promover o esquecimento do indivíduo, pois os Sacerdotes Provinciais deixavam Tenochtitlán para serem missionários em regiões distantes, tanto tributária, quanto não. Sua função era levar a fé Asteca a outros povos e, se obtivesse relevância em seus feitos, seria nomeado Grande Sacerdote.
24) Sacerdotes de Bairro: Neste grau, os Pochteca podiam chegar, uma vez que seus filhos podiam freqüentar o Calmecac, eram os recém-formados sacerdotes, que regressavam a seus Calpulli, onde além de lecionarem nas Telpochcalli, ainda cuidariam dos cultos ancestrais de seu clã, bem como manteriam a unidade religiosa entre este e o clero oficial, cujo chefe supremo era o Tlatoani. Se mostrassem muita eficácia em sua função, eram promovidos a Sacerdotes Provinciais.
Danilo José Figueiredo
Fonte: www.klepsidra.net
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